A cidade de Santos, no litoral de São Paulo, que já abriga o maior complexo portuário do Brasil, está no centro de uma movimentada discussão sobre o futuro da infraestrutura para cruzeiros marítimos. Dois projetos distintos disputam protagonismo para abrigar o novo terminal de passageiros: o projeto privado da Transbrasa, na Ponta da Praia, e a proposta da Prefeitura de Santos, que defende a transferência do atual terminal Giusfredo Santini, hoje em Outeirinhos, para a região central da cidade, no Valongo.
Ambas as propostas refletem visões diferentes sobre o desenvolvimento urbano, ambiental e turístico de Santos. A seguir, exploramos os detalhes de cada iniciativa e os desafios que elas enfrentam.
Projeto Santos Vivo: a proposta da Transbrasa para a Ponta da Praia
Com um investimento previsto de R$ 1,247 bilhão, o projeto Santos Vivo, idealizado pelo Grupo Transbrasa, pretende construir um novo terminal de cruzeiros em uma área de quase 295 mil m², localizada na Ponta da Praia, às margens da Baía de Santos. A proposta foi idealizada há mais de 20 anos pela empresa, que já opera um terminal retroportuário na cidade, e ganhou novo fôlego após a autorização administrativa do Ministério de Portos e Aeroportos (MPor), que oficializou a adesão do contrato.
O projeto vai muito além de um terminal de passageiros. Ele prevê a construção de dois berços de atracação para navios de cruzeiro, um centro de convenções, uma marina, um shopping center, hotel, edifício comercial e até mesmo uma ilha artificial, conectada ao molhe paralelo ao canal de navegação. Segundo a Transbrasa, trata-se de um empreendimento que tem como objetivo transformar a cidade em referência internacional em turismo e logística portuária.
Apesar dos avanços no processo junto ao governo federal, o projeto ainda depende de uma série de autorizações e licenças, como da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) — por se tratar de uma área federal —, da Marinha do Brasil, devido à interferência no canal de navegação, da Prefeitura de Santos e dos órgãos ambientais.
A Transbrasa reconhece que ainda há um caminho técnico e legal a ser percorrido, mas considera a autorização do MPor um passo decisivo para a continuidade dos estudos. Em nota, a empresa destacou que o terminal será um marco no desenvolvimento turístico, portuário e sustentável da cidade.
Prefeitura de Santos defende o Valongo como localização ideal
Paralelamente, a Prefeitura de Santos promove sua própria proposta: a transferência do atual terminal de cruzeiros, localizado no cais do Outeirinhos, para o bairro do Valongo, na região central da cidade. O objetivo é claro: integrar a nova infraestrutura ao projeto de revitalização do centro histórico, especialmente com a criação do Parque Valongo, e com isso fortalecer o turismo cultural e urbano.
O novo terminal no Valongo ocuparia uma área de 85 mil m², o dobro da estrutura atual, e teria capacidade para receber até três navios simultaneamente, com até 6 mil passageiros cada. A proposta também está vinculada ao leilão do Tecon Santos 10, que será o maior terminal de contêineres do país, e que deverá financiar, como contrapartida, a construção da nova estrutura para cruzeiros.
De acordo com o secretário de Assuntos Portuários e Marítimos de Santos, Bruno Orlandi, esta é a única proposta apoiada oficialmente pelo governo municipal. Ele destaca que o Valongo é a única área com respaldo legal para a instalação de um terminal turístico, conforme o Plano Diretor de Santos e a Lei de Uso e Ocupação do Solo. Essas normas estabelecem como diretriz prioritária a implantação de estruturas turísticas no centro da cidade, mais precisamente na área denominada Núcleo de Intervenção e Diretrizes Estratégicas (NIDE) 1 – Valongo.
Ainda segundo Orlandi, o terminal no centro de Santos segue o exemplo de grandes cidades turísticas, como Paris e Londres, que valorizam a localização central de suas infraestruturas de recepção turística. Para a administração municipal, qualquer outro projeto fora da região central representa apenas uma intenção privada, sem amparo jurídico e com impactos urbanísticos e ambientais significativos.
Dois caminhos, uma cidade: e o que está em jogo?
Os dois projetos — Santos Vivo, da iniciativa privada, e o terminal no Valongo, de iniciativa pública — revelam uma disputa que vai além de localização e investimento. O que está em jogo é o modelo de desenvolvimento urbano e turístico que Santos deseja seguir nos próximos anos.
A proposta da Transbrasa aposta em um modelo mais robusto, ancorado na multifuncionalidade e no turismo de alto padrão, com impacto direto na economia da cidade e atração de grandes cruzeiros. Já o plano da Prefeitura aposta em um modelo de requalificação urbana, com foco na valorização do centro histórico, integração com outros projetos e impacto direto no cotidiano dos moradores e comerciantes da região central.
Ambos os projetos têm pontos positivos e desafios. O Santos Vivo, embora ambicioso, precisa superar barreiras legais e ambientais complexas. A instalação na Ponta da Praia exigirá adaptações de grande porte no canal de navegação e poderá impactar significativamente o tráfego marítimo e a vizinhança.
Por outro lado, o projeto do Valongo, embora respaldado pela legislação municipal e mais alinhado com o planejamento urbano da cidade, depende de viabilidade econômica e da concretização do leilão do Tecon Santos 10, além de articulação política entre diferentes esferas do governo.
E o terminal atual, o que acontece?
Hoje, os cruzeiros em Santos atracam no Terminal Giusfredo Santini, no cais do Outeirinhos. Esse terminal é administrado pela empresa Concais e tem operado por anos como principal porta de entrada e saída de cruzeiristas no Brasil. A proposta da prefeitura prevê a desativação gradual dessa estrutura, com a mudança definitiva para o Valongo, caso o projeto seja implementado.
A manutenção simultânea de dois terminais de cruzeiros em Santos não é descartada, principalmente diante do crescimento constante do setor de turismo marítimo no país. A temporada 2024/2025 promete ser uma das mais movimentadas dos últimos anos, o que reforça a necessidade de modernizar e ampliar a infraestrutura da cidade para atender à demanda crescente.
O papel do governo federal e os próximos passos
Com a assinatura do contrato de adesão ao projeto Santos Vivo, o Ministério de Portos e Aeroportos e a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) assumem a responsabilidade de fiscalizar os próximos passos e garantir que os investimentos sigam o cronograma. Ainda assim, qualquer avanço físico depende da aprovação de múltiplos órgãos reguladores e licenciadores.
Além do projeto em Santos, o governo federal também autorizou recentemente quatro novos contratos para terminais privados e a expansão de outros já em operação, totalizando mais de R$ 4,7 bilhões em investimentos no setor portuário.
Conclusão: qual será o futuro do turismo marítimo em Santos?
Com dois projetos robustos em pauta, Santos vive um momento decisivo para o futuro do seu turismo marítimo. Enquanto a Transbrasa busca consolidar um megaprojeto inovador na Ponta da Praia, a Prefeitura aposta na revitalização do centro histórico como caminho para transformar o Valongo em referência nacional em recepção de cruzeiros.
Independentemente de qual proposta avance, o mais importante é que o debate seja feito com transparência, critérios técnicos, respeito à legislação e diálogo com a população. Afinal, a escolha do novo terminal de cruzeiros impactará diretamente o cotidiano da cidade, o meio ambiente, o setor portuário e o turismo nacional.
A Infinity Brazil acompanha de perto esses desdobramentos, sempre de olho nas transformações que moldam o setor de cruzeiros no Brasil — e no mundo.